Comecei a trabalhar na área das respostas e recursos sociais há 31 anos, aqui em Cascais, onde vivo desde sempre e o cartão mais solidário foi um dos últimos projetos a que estive ligada. Sentir que foi possível criar soluções para pessoas em situação de vulnerabilidade sócio económica, naquele que é também o meu território, foi mais do que um trabalho. Foi uma oportunidade de realização de uma aspiração profissional que há muito estava na nossa agenda e que levei por diante, naturalmente não sozinha, mas integrada numa equipa com muita qualidade e com um grande compromisso com a qual tive o privilégio de trabalhar.
Quando por volta dos anos 90, a Câmara começou a dedicar mais atenção a estas questões da privação, já havia várias organizações de voluntários e IPSS que estavam a centrar a sua ação em respostas a esta faixa da população. Nessa altura o trabalho tinha um carater mais “assistencialista”, assente em apoios alimentares e algum apoio monetário mas, sobretudo, mais individualista. Corria a par com a intervenção já então desenvolvida com o propósito de quebrar os ciclos de pobreza, com foco no rendimento, no emprego e em tantas outras componentes que contribuem para que a pobreza e a privação se instalem e perdurem em diversas situações.
No município quisemos então conhecer melhor os parceiros e fomos percebendo que, para intervir de forma mais otimizada e concertada, era fundamental uma maior articulação do trabalho desenvolvido por cada um que permitisse, a par com o financiamento para apoio e alargamento de recursos junto da população, a co construção de uma visão e uma estratégia conjunta para a intervenção nesta realidade bem como a capacitação dos vários atores em presença para uma maior qualidade na intervenção.
O cartão mais solidário vem assim responder a uma aspiração coletiva de vários parceiros que se enquadra num processo de qualificação do modo de intervir na privação material.
Na verdade, estávamos a trabalhar na ideia já há 2 anos quando chegou a pandemia e houve a perceção de que havia situações que se estavam a agudizar, até de famílias que nunca tinham precisado de ajuda. Foi assim que o projeto se concretizou.
Neste concelho há uma grande vontade de querer fazer, de querer mudar, de querer contribuir, uma disponibilidade para nos irmos reinventando. Não apenas na Câmara, mas também nas várias organizações parceiras que intervêm no território concelhio. O meu trabalho não aconteceu numa realidade estática, mas numa realidade que foi sempre puxando por mim profissionalmente. Foi um privilégio
Quando olho para trás, para o que esperava quando acabei de me formar, posso dizer que o meu percurso profissional superou todas as minhas expectativas iniciais. O cartão mais solidário, um dos últimos projetos a que estive ligada, é um bom exemplo disto até porque está pensado para chegar a novos públicos, a pessoas que tradicionalmente não costumavam aceder a estas respostas, dando um pequeno contributo para a superação de uma fase delicada das suas vidas. Estando agora a despedir-me desta área, espero que este seja apenas o primeiro de muitos projetos que venham a ser desenvolvidos e garantam maior dignidade, autonomia e poder de escolha nos apoios na privação material a todos os que se veem na necessidade de a eles recorrer.